Em artigo, jornalista testa a eficiência do sistema operacional de reclamações da agência. E a taxa de sucesso foi baixíssima: apenas 0,86%.

Leão Serva, jornalista

Certamente já te aconteceu de discar um número conhecido, para casa ou alguém íntimo, e ouvir da operadora a mensagem: “Esse número de telefone não existe” ou “esse telefone está programado para não receber ligação”. Você provavelmente pensa: “digitei errado”, pois sabe que o número existe e não está programado pra nada.

Essas respostas erradas revelam defeito no serviço telefônico. Mas podem servir para dissimular um problema mais grave. Ao ouvi-las, os usuários podem não se dar conta de que o sistema está congestionado (o que justifica punição à companhia). As mensagens amalucadas podem esconder um defeito maior com um menor.

Recentemente procurei a Anatel para perguntar que tipo de providências a agência toma contra essas ocorrências defeituosas. Em e-mail, a assessoria de imprensa informou (em 20 de fevereiro): “Quanto a existência de mensagens ‘estranhas’ retornadas pela operadora em chamadas para telefones comuns, que os usuários sabem que existem e outras situações que não se correlacionam com a realidade, a agência já tomou conhecimento dessas ocorrências e abriu procedimento de fiscalização para averiguação”.

Uma das formas que a agência usa para detectar falhas na telefonia é a quantidade de reclamações de usuários. Na última terça-feira (11) decidi testar o telefone 1331 (canal para reclamação do usuário). Comecei a ligar às 9h. As ligações geravam sinal de ocupado. As que se completavam, me direcionaram a um sistema automático, chamado URA (“Para acompanhamento de solicitação, tecle 1; para outra solicitação, tecle 2”). Ao teclar 2, vinha um silêncio sepulcral até a linha cair, sempre ao completar 59 segundos ou 1 minuto.

Ao todo, foram 115 telefonemas até as 14h. De todos, dez vezes a ligação se completou (9%) e 105 vezes deu ocupado; dessas dez, oito vezes (80%) a linha caiu após 1 minuto, à espera da opção 2. Das duas vezes em que fui atendido, na primeira, às 13h31, a ligação caiu após sete minutos, antes de eu completar a explicação. Liguei de novo: 32 tentativas depois (só uma vez cheguei à URA; a ligação caiu), às 13h44 fui atendido, a pessoa me informou que o primeiro telefonema não gerara registro. Começamos tudo de novo.

Ao fim, um chamado bem sucedido em 115 tentativas. Eficiência da Anatel: 0,86%.

Perguntei à assessoria da agência sobre essa performance. A resposta foi que a agência identificou “falhas no serviço prestado pela empresa que opera a Central de Atendimento Telefônico que vêm resultando em funcionamento do call center da Anatel em níveis abaixo da capacidade esperada”. E que a entidade “instaurou um processo de substituição da empresa. (…) Uma nova contratada deve assumir as operações em breve e, com a substituição, espera-se a normalização do atendimento”.

Na quinta-feira, a linha seguia frequentemente ocupada. Mas a URA ganhou uma mensagem inicial que diz: “No momento, todos os nossos operadores estão ocupados” e recomenda outras formas de registrar reclamações, antes de passar às duas opções.

A julgar pela taxa de sucesso de 0,86%, infere-se que a cada reclamação contra empresas que chega à Anatel, 115 outras não puderam ser feitas. A agência diz que em 2013 registrou 7,67 milhões de atendimentos a consumidores. O que sugere que 875 milhões de reclamações podem ter ficado sem resposta (2,4 milhões/dia).

Artigo publicado no jornal Folha de S.Paulo em 17 de março de 2014.