O Estado de S.Paulo – Editorial
Como se não bastassem os muitos problemas com que já se debatem os vários meios de transporte coletivo da capital paulista, a existência de mais um – e de peso – acaba de ficar evidente: o despreparo do Metrô para lidar com os acidentes que se vêm repetindo em suas linhas. Situação tanto mais lastimável por ser este, reconhecidamente, o meio que presta os melhores serviços. A pane ocorrida no final da tarde de terça-feira na Linha 3-Vermelha causou sérios transtornos para os passageiros e por pouco os conflitos entre eles e os seguranças da empresa não levaram a consequências ainda piores.
O problema começou com a falha nas portas de um dos trens daquela linha, que acarretou sucessivas paralisações que afetaram 10 das suas 18 estações. O serviço ficou interrompido nesse trecho por um dos períodos mais longos na história de casos desse tipo. Foram 5 horas – das 18h19 até as 23h22. Essa demora, a superlotação e o calor se combinaram para agravar a situação. Espremidos, sem ar condicionado e sem saber por quanto tempo deveriam esperar para que a falha fosse reparada e os trens voltassem a circular, muitos passageiros perderam a paciência.
Acionaram os botões de emergência para abrir as portas dos vagões e a grande maioria – neles ficaram apenas os que, enfraquecidos, não tinham condições de reagir – saiu para os corredores estreitos aos lados dos trilhos, em direção à estação mais próxima. Ao longo da linha afetada, foram milhares os que fizeram isso, apesar dos riscos para sua segurança.
Os relatos colhidos pela reportagem mostram cenas de pânico, de desespero, de pessoas chorando, passando mal por causa do calor sufocante, principalmente idosos, mulheres e crianças. “Uma moça passando mal dentro do trem queria sair. Mas um segurança queria fechar a porta de qualquer jeito. Só que o povo não deixou”, conta uma passageira. Ela viu um jovem ser agarrado pelo pescoço pelos seguranças. “Aí o pessoal partiu para cima dos seguranças, que foram dando cacetadas.” Esse relato resume o que houve.
Em vez de acalmados – como seria de esperar, pois eram eles as vítimas, que haviam acabado de passar por momentos difíceis -, os passageiros foram agredidos pelos seguranças. Revoltados, revidaram e destruíram parte dos equipamentos da Estação Sé e danificaram os trens ali parados.
Um episódio lastimável, sob todos os aspectos, que mostra o despreparo do Metrô – a começar pelo seu serviço de segurança – para enfrentar situações como essa. E o pior é que, em vez de reconhecer o erro – primeiro passo para corrigi-lo -, as autoridades estaduais estão buscando desculpas para justificar o injustificável. O secretário dos Transportes Metropolitanos, Jurandir Fernandes, denunciou imediatamente a ação de “grupos organizados”. Um pouco – mas só um pouco – mais prudente, o governador Geraldo Alckmin falou na ação de um grupo de vândalos e não descartou a possibilidade de ter havido “sabotagem”, ressalvando, porém, que o caso deve ser “investigado com seriedade”.
Mesmo que a sabotagem e a ação de grupos organizados, levantadas apressadamente, se confirmassem – e nada indica que tal vá acontecer -, isso não justificaria o descontrole da segurança, que tratou com violência os passageiros. Também não se poderia alegar como atenuante o fato de o Metrô estar operando no limite de sua capacidade.
É verdade que isso ocorre e que uma das suas consequências é a repetição cada vez mais frequente de panes no sistema. Mas essa é uma realidade com a qual o Metrô terá de conviver por um bom tempo, pois a expansão da rede é muito mais lenta do que o aumento da sua procura pelos passageiros, pela qualidade do serviço que presta, mesmo superlotado.
Essa é uma realidade para a qual o Metrô – está se vendo – precisa se preparar melhor. Se as panes são inevitáveis nessa fase, é preciso saber lidar com suas consequências. As vítimas delas são os passageiros, que por isso não podem ser tratados com truculência.