O Estado de S. Paulo – Editorial
Estimulados pelo tratamento leniente que lhes tem sido dado pelas autoridades, os movimentos sociais estão aumentando o ritmo de invasões de prédios públicos e particulares na cidade de São Paulo. Entre o domingo e a madrugada de segunda-feira eles ocuparam parte das dependências do Serviço Funerário Municipal, no Parque Novo Mundo, na zona norte, e o prédio do antigo Othon Palace Hotel, no centro da cidade.
Invadiram o Serviço Funerário Municipal cerca de 50 pessoas vinculadas ao Movimento dos Sem-Terra (MST). Elas vieram de um terreno que ocupavam no Parque Novo Mundo, do qual tiveram de sair por determinação da Justiça, uma vez que no local será erguido um Centro Educacional Unificado (CEU). Já o prédio onde até 2008 funcionou o Othon Palace Hotel, um dos símbolos da hotelaria de luxo de São Paulo entre 1950 e 1970, foi ocupado por um grupo de 200 pessoas vinculado ao Movimento de Luta por Moradia Digna (MLMD). Com 24 andares, o prédio – na esquina da Praça do Patriarca com a Rua Líbero Badaró – foi comprado pela Prefeitura para abrigar a Secretaria Municipal de Finanças. A entrada estava bloqueada com tijolos, o que não conteve os invasores. E a Guarda Civil Metropolitana, que deveria protegê-lo, agiu como espectadora.
Por situar-se justamente ao lado da sede da Prefeitura Municipal, no Viaduto do Chá, essa invasão dá a medida do grau de desordem e anarquia que tem tomado a capital. Ao lado da Prefeitura, que representa o poder constituído na cidade, agora se encontra um edifício invadido que simboliza a afronta ao império da lei, o desacato da autoridade e o desrespeito do Estado Democrático.
Depois de tratar como interlocutores legítimos “líderes” desabusados, cujas iniciativas e ações são acintosamente ilegais e criminosas, o prefeito Fernando Haddad será obrigado assim a conviver diariamente, lado a lado, com quem tenta constrangê-lo moralmente e manipulá-lo politicamente, na base do grito e da violência, a pretexto de pressioná-lo a construir moradias populares.
Cedendo cada vez mais às pressões abusivas e às reivindicações absurdas dessas lideranças truculentas, a ponto de ter prometido insensatamente ao Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST) que apresentará uma emenda ao projeto de Revisão do Plano Diretor com o objetivo de viabilizar a legalização da invasão criminosa de uma área de 150 mil metros quadrados situada a 4 km de distância do Estádio do Corinthians, em Itaquera, o prefeito agora começa a colher os dividendos de seus atos demagógicos, com vistas ao pleito de outubro próximo.
Se tivesse tomado na hora certa medidas legais e administrativas para coibir invasões e se recusado a dialogar com grupos marcados pela intolerância e pela violência, Haddad não teria caído na armadilha que lhe foi preparada. Há dois anos, seu partido – o PT – criticou fortemente o governo tucano do Estado de São Paulo, por ocasião da desocupação de uma área denominada Pinheirinho, em São José dos Campos. Também acusou o governador Geraldo Alckmin de não ser sensível à regularização fundiária de áreas particulares ocupadas irregularmente com a construção de casas populares. Para preservar o que lhe resta de autoridade, Haddad não tem outra saída a não ser esperar que a Justiça autorize a imediata execução, pela PM, da ação de reintegração de posse do prédio do antigo Othon Palace Hotel. Caso contrário, será desafiado permanentemente, até o fim de seu mandato, pelos movimentos de sem-teto.
Evidentemente, quando a ordem judicial para a desocupação for executada, os prejuízos à cidade serão vultosos, por causa dos custos da mobilização policial, das depredações e de mais explosões de violência numa das áreas mais movimentadas da capital. Isso poderia ter sido evitado, caso não houvesse leniência, por parte das autoridades, com quem descumpre a lei.
N. da R. – Ontem à tarde, um grupo de sem-teto invadiu a sede da Companhia de Desenvolvimento Habitacional do Estado de São Paulo (CDHU), na Rua Boa Vista.
Editorial publicado no dia 3 de junho de 2014.