Hoje não quero falar de política, eleições, coligações. Não apontarei defeitos nem (as muitas) qualidades da nossa cidade, que está completando 460 anos. Ao contrário de outros aniversários de São Paulo, desta vez não há discurso.
Tivesse engenho e arte, faria um poema. Mas, neste dia 25, decidi fazer uma oração, agradecer a Deus a oportunidade de ter sido prefeito e trabalhado junto com os paulistanos por uma cidade melhor.
Vitórias que nos trouxeram alegrias, dificuldades que nos deixaram lições… As palavras foram surgindo, vindo do meu interior, emergindo em lembranças da minha infância no bairro de Pinheiros, encontros em família, escola, trabalho, vida pública… Tudo se alternando, passando por vales e planícies até hoje, quando me preparo para novos desafios.
Desculpe-me se este artigo tem esse tom, diferente daquele dos textos da engenharia e da economia que estudei na USP. Ele é diverso da maioria dos discursos e projetos da política, que exige a precisão do planejamento, a frieza dos números e a certeza dos cálculos. Permita-me que ele continue espontâneo, com a fé e os contornos de uma prece.
Penso em paulistanos, penso em trabalho. É quase um carimbo, às vezes jocoso, que os brasileiros de São Paulo têm por esse Brasil afora. Sim, paulista gosta de trabalhar, de ir à luta, ver a cidade crescer, superar barreiras, abrir horizontes. Que o trabalho seja sempre, meu Deus, o fermento que traga o sustento, o conforto e o progresso, que una e dignifique homens e mulheres que aqui batalham para o Brasil crescer.
Que os nossos jovens avancem desenvoltos, orgulhosos da nossa metrópole, com seu vestir e falar descolados, irreverentes, livres pelos corredores dos shoppings, pelos parques, ciclovias, praças e avenidas, espaços culturais, como fazíamos nos footings das avenidas do interior, nos largos da igreja, nas quermesses, nos campos onde até hoje soltamos pipas e jogamos futebol…
Que os rolês sigam rolando como vinham sendo até então, na paz, e os jovens possam curtir, consumir e exercer os seus direitos e os seus inconformismos, sem intolerância, sem preconceitos. E dentro da lei.
Que a nossa cidade, meu Deus, conquiste paz e segurança e que o medo da violência, das drogas e do crime seja substituído pela confiança num policiamento firme, sim, mas solidário, que entenda e valorize o convívio e saiba, além de advertir e reprimir, dialogar e educar. E que a fraternidade e humanidade -e não a prepotência e a crueldade- viabilizem a recuperação de presos, julgados e condenados.
Que os níveis de poder se unam e se irmanem, tenham certeza e lucidez no uso da força, sempre sob os limites da lei e sob o império da justiça, para conter o crime que esgarça a confiança da sociedade no Estado. Que planejem, testem e construam juntos, profissionalmente e não episodicamente, políticas públicas de prevenção, contenção, policiamento, enfrentamento. Olho por olho não é segurança, é vingança.
Crueldade não constrói a paz, só exacerba e alimenta o ódio.
Que diante de tantas dificuldades a vencer, nossa São Paulo tenha a fé de Anchieta, a coragem dos bandeirantes e a força dos nossos empreendedores para olhar para o futuro que devemos construir e avançar, pondo abaixo a tristeza das favelas, erguendo mais casas, mais escolas e mais empregos, com mais liberdade para ir e vir, criticar e se expressar…
Que possa, como faço hoje, meu Deus, seguir aplicando todas as minhas forças, cabeça e coração no bem das pessoas, dos brasileiros de São Paulo, cidade e Estado que estarão sempre nas minhas preces. E que sempre me conduza o estímulo de meus pais, que me diziam que “na vida não há problemas grandes, mas problemas a serem resolvidos com grandeza”. Que, enquanto homem público, eu possa manter a determinação de lutar, empreender, revolucionar e sonhar. E que rolem esperança e fraternidade nos caminhos de São Paulo.
Artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo em 24 de janeiro de 2014.