Em texto publicado no Diário de S. Paulo, o presidente nacional do PSD lamenta a morte de brasileiros pela covid-19 e defende o diálogo e a “reconstrução de um País fraterno, solidário, sem ódios, dentro das normas constitucionais até as eleições de 2022”

 

 

 

Gilberto Kassab, presidente nacional do PSD

 

Nossas lágrimas logo chegarão aos quase 50 mil mortos vítimas da pandemia. Filhos da Pátria brasileira que descansam no silêncio do seu solo gentil. Milhares de irmãs e irmãos de terra, de língua, de cultura, de amigos de outras pátrias que aqui estavam, que aqui viviam. Que enterraram, de repente, princípios, crenças e valores. Bem mais que vejo, ainda sinto toda hora famílias chorando inconsoláveis… não haverá mais risos, histórias, abraços, amores. Adeus convívio que nos alimenta a alma. Um último e rápido adeus aos idosos, memórias vivas de um tempo que se foi. Aos nossos jovens e crianças, potencial que jaz inerte, já sem esperança e oportunidade de florescer, fazer história.

Irmãos que se foram, com vocês levem nossas saudades e nossas preces.

Desculpem-me, se coloco aqui e agora, emoções que afloram das imagens, das histórias que vi e vejo Brasil afora – pela TV – e, algumas, que vivi e senti de perto. Não conseguiria escrever sem aliviar a alma, como numa prece, dessa dor imensa armazenada. Amém.

Ganhou-me o sentimento. E vida que segue.

Num domingo, semanas atrás, milhares de brasileiros foram às ruas, em movimentos pró e contra governos. Sem violência. Sem repressão. Outras manifestações se seguiram, se repetem. A expressão desses atos só não foi maior por causa das limitações impostas pela pandemia que nos assola. Mas não nos verga.

Ganhou-nos a democracia.

Nos Estados Unidos, todos os 50 Estados americanos foram às ruas protestar contra o assassinato brutal de um cidadão negro, George Floyd, por um policial de Minneapolis. O movimento se espalhou pela Europa, por vários países do mundo. A luta antirracista chegou aqui; unindo etnias, solidárias, fizeram protestos e respiraram unidos nas ruas.

Ganhou vida a luta antirracista.

Em vários Estados brasileiros, grupos políticos de campos diferentes uniram forças na luta contra o coronavírus. Em várias capitais e tantas cidades, diferenças ideológicas e partidárias também foram superadas. Lideranças nacionais se reencontram em defesa da Democracia. À esquerda e à direita, nosso País se manifesta. No Congresso, unidos pelo bem do Brasil, lutaremos juntos, superando conflitos e irracionalidades.

Ganhará a tolerância.

Os brasileiros, acompanhando permanentemente a evolução da covid-19, a busca por medidas que dificultem o contágio, pelo desenvolvimento de remédios e vacina, se preocuparam com a possibilidade de mudança na divulgação de dados oficiais. A união da sociedade, alerta, proporcionou ainda mais dados para que todos estejam informados sobre a evolução da doença em nosso país.

Ganhou a transparência.

As Forças Armadas brasileiras, que há 31 anos, desde o fim da ditadura, cumprem constitucionalmente seu papel institucional, volta e meia são citadas como prováveis ocupantes do Palácio da Alvorada. Já se manifestaram, para dar tranquilidade ao país sobre seu papel constitucional: isso está fora de pauta. Serão, como manda a lei maior, e como organismo de Estado, os defensores da soberania da pátria, guardiãs dos três poderes da república. Livres e independentes, como reza a Constituição.

Ganha e perdura a democracia.

Congresso, Executivo e Judiciário seguem trabalhando, mesmo com alguns ataques que volta e meia surgem em faixas e pequenas manifestações antidemocráticas, para vencer a pandemia, os desafios da economia, da luta pelas esperadas reformas que diminuam as desigualdades sociais. Elaborando, enviando, discutindo. Distonia? Sim, na luta pela contenção do coronavírus. Ao mesmo tempo em que desempregados e trabalhadores informais recebem ajuda social. Precisam mais. Receberão.

Ganhará a democracia.

A Polícia Federal e o Ministério Público agem contra gestores de alguns Estados e municípios. Denúncias, investigações que levantam crimes na compra de equipamentos para o combate à covid-19.

Muito trabalho, muito o que fazer, muito debate, busca de consenso e entendimentos, naturais num contexto nacional e mundial inédito e complexo. Por vezes exaltados. A temperatura sobe entre os três poderes republicanos, cada qual procurando, tentando fazer o melhor pelo Brasil. É preciso tolerância e paciência.

O governo envia ao Congresso Medida Provisória que concede ao Ministério da Educação o direito de indicar reitores a faculdades federais. O presidente do Congresso, julgando a MP inconstitucional, devolve-a à Presidência. Respeitando a Constituição, o Presidente cancela a MP. Tanto a devolução como o cancelamento são registrados no “Diário Oficial”.

Ganha a Democracia e a paz se faz entre os poderes da República.

Mas há esperança, vacinas em desenvolvimento no mundo inteiro. Eis que a esperança desponta concreta: alguns Estados anunciam parcerias para participar, já na fase 3 de testes, de projetos de vacina com laboratórios estrangeiros. Projetos em estágio adiantado, que preconiza possível vacinação de brasileiros contra o coronavírus ainda no primeiro semestre do ano que vem.

Ganha a competência e seriedade da Ciência brasileira.

E assim, caminhando juntos, distantes de radicalismos à direita e à esquerda – com ponderação, debate civilizado e sempre sob a luz da Constituição – Executivo, Judiciário e Congresso vencerão não apenas a pandemia, mas a delicada trajetória que nos levará às eleições municipais. Sem ódios que nada constroem.

Ganha a esperança do recomeço.

Da reconstrução de um País fraterno, solidário, sem ódios. Que seja um caminho menos litigioso e mais fraterno a percorrer, a se administrar com equilíbrio, com muita energia e dentro das normas constitucionais até as eleições de 2022.

Um jogo a ser jogado pelos três poderes da República, superando obstáculos e com perspectivas concretas de um aperto de mãos sem luva e abraços sem máscara.

Ganhando a democracia, ganham todos os brasileiros.

E teremos pela frente, muito tempo para solidificar o Estado Democrático de Direito, reconstruir uma nação mais justa, mais igual, fraterna e solidária.

Um Brasil sem nenhum tipo de joelho no pescoço.

 

Artigo publicado no jornal Diário de S. Paulo em 23 de junho de 2020.