Junji Abe, ex-prefeito de Mogi das Cruzes e ex-deputado federal pelo PSD-SP
Aos 75 anos de idade, com mais de meio século dedicado à vida pública – desde organizações classistas à política partidária – tomei uma das decisões mais difíceis da minha existência. Decidi que não vou disputar as próximas eleições municipais. Retirei meu nome do quadro de pré-candidatos a prefeito de Mogi das Cruzes, colocando-me como mais um soldado do meu partido, o PSD (Partido Social Democrático), a quem cabe definir os rumos da legenda na disputa eleitoral.
Embora delicada, dolorosa e complexa para mim, a decisão a que cheguei é fruto de um raciocínio simples. Porém, carregado de sentimentos. Calcados em denúncias infundadas, os ataques dantescos desferidos contra mim ensaiam o tom que terá a campanha eleitoral que se aproxima, caso eu me mantenha na disputa. Não será um debate de ideias, com propostas para melhorar a vida da população mogiana. Ao contrário, tudo girará em torno da desconstrução. De imagem, de realizações, de ideais e de sonhos. A população de Mogi das Cruzes não merece o show de horrores que se delineia. Pior, não merece que seu futuro seja tratado com tanto desprezo, baixeza de espírito e vácuo de caráter.
Imaginem como seriam os 45 dias de campanha. De um lado, ataques vis de toda parte, antecipando condenações que simplesmente não existem. De outro, eu explicando que nunca sofri condenação consumada, nunca agi de maneira a prejudicar a população e nem os cofres públicos e muito menos enriqueci às custas do dinheiro público. Os processos a que respondo são denúncias improcedentes que a Justiça ainda não julgou.
Para piorar, muitos acreditarão nos boatos torpes de que sou ficha suja e inelegível. É tudo mentira deslavada. Não existe decisão judicial que me inclua na categoria de alguém que tenha violado a Lei da Ficha Limpa. Não sofri qualquer condenação na Justiça que se enquadre no conceito de ficha suja. Atribuir a mim tal imputação é algo absolutamente errado e leviano. Mantenho a ficha limpa e sou livre para disputar eleições. “O deferimento do registro do recorrente é medida que se impõe, devendo ser afastada a inelegibilidade”, manifestou-se a ministra do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Luciana Lóssio, em relação ao meu direito de concorrer a deputado federal em 2014, desfazendo um entendimento equivocado do Tribunal Regional Eleitoral (TRE).
Não receio ataques nem xingamentos. Isso não me aterroriza. Não a mim que passei a infância sendo chamado de “olhos rasgados” e sofrendo bullying na escola (na época, o conceito nem existia) por usar roupas feitas pela mamãe com sacos de algodão, porque faltava dinheiro para o uniforme convencional. Não intimida a mim que, durante campanhas eleitorais, sofri discriminação racial por causa dos meus traços orientais e preconceito social por ser um agricultor. Portanto, não são acusações infundadas nem o factoide da inelegibilidade que me levam a tomar a presente decisão.
O que me move, acima de tudo, é a minha Mogi das Cruzes. Na vida, há situações administráveis; outras, toleráveis. Mas, passar a campanha eleitoral num infindável bate-boca improdutivo e natimorto de propostas é algo impensável para alguém como eu. Me recuso a ceder ao egoísmo de lutar pelo meu próprio desejo enquanto o povo mogiano fica relegado ao último plano. Me lembro das noites frias de junho de 2000, quando percorremos os bairros promovendo um verdadeiro mutirão popular para detectar os anseios da população, coletar ideias e alinhar propostas para dar origem ao que seria o PGP – Plano de Governo Participativo. Em outro ponto, especialistas voluntários das mais diversas áreas do conhecimento humano estudavam os projetos. Tudo o que era viável ou possível entrou no documento final – colocado em prática a partir da nossa primeira gestão, em 2001 – que, por sua vez, virou o embrião do primeiro Plano Diretor da história da Cidade.
Enquanto refletia sobre os rumos das eleições, me lembrei daquelas reuniões populares. O povo semeou a rede de prós para atendimento médico especializado que viríamos a concretizar como prefeito: Pró-Mulher, Pró-Criança, Pró-Hiper (para a terceira idade) e Promeg (Programa de Medicamentos Gratuitos). Até o Pró-Parto, alvo de acusação infundada que levou ao bloqueio dos meus bens, surgiu exatamente para aliviar a Santa Casa que sofria com a alta demanda e amargava sucessivos casos de mortes de recém-nascidos.
Levantamento da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) mostra que a mortalidade infantil em Mogi das Cruzes caiu 47% em 2008, quando funcionavam a rede de prós, em relação a 2000. Naquele ano, a Cidade tinha um índice de 21,5 mortes para cada mil bebês nascidos vivos. Em 2008, de cada mil bebês, 11,3 não sobreviviam até o primeiro ano de vida.
Também é relevante citar os gigantescos investimentos em saneamento básico, com as construções das Estações de Tratamento de Água (Av. João XXIII) e Esgoto (ao lado do Parque Centenário). Ao iniciarmos a administração, em 2001, a Cidade tratava parcos 0,5% dos esgotos coletados. Ao fim das nossas duas gestões, o índice de tratamento dos efluentes recolhidos já tinha atingido 43%. São benefícios para melhoria da qualidade de vida.
De quebra, azeitamos as relações com outras esferas de governo, como o Estado, para viabilizar a duplicação da Mogi-Dutra e a ampliação do Hospital Luzia de Pinho Melo, entre outras realizações. Porém, isso também não serve de parâmetro. Vale mais a acusação improcedente. Tudo o que é alegado na denúncia não está comprovado nos autos por perícia, auditoria e demais instrumentos factíveis para avaliação. A comparação é ainda pior. É de má fé mesmo. Compara o preço de uma única refeição com o valor total da alimentação de um dia inteiro, fornecida para a mãe e para o acompanhante. Isso dá, no mínimo, oito refeições, além do que era oferecido aos recém-nascidos que rejeitavam o leite materno, da estrutura do serviço, como mão de obra, utensílios domésticos, mamadeiras etc., e da supervisão de uma nutricionista.
As pessoas estão saturadas da classe política. Com razão. Ao sofrer ataques, seria forçado a usar o tempo para me defender das falsas acusações. Nada de propostas. Só um festival de vilanias. Nem vou dizer do sofrimento voraz impingido à minha esposa Elza, aos meus filhos, netos e amigos, assim como às pessoas que nos conhecem, admiram e manifestam apoio ao projeto político que havíamos traçado. A todos, peço compreensão! Porém, não vou compactuar com a virulência de maus adversários contra pessoas de bem.
Lembro-me das mães que acampavam em frente às escolas em 2000, em busca de vagas para os filhos. Elas orquestraram a revolução que se processaria na educação, com a construção de prédios e reforma dos existentes para ampliar em mais de 70% o número de vagas, a modernização plena da rede escolar com recursos multimídia e espaços poliesportivos, a instalação de 43 creches (eram só 32), a criação do inédito Pró-Escolar para portadores de necessidades educacionais especiais, o mais completo Centro Municipal de Formação Pedagógica (Cemforpe) e o primeiro Centro de Programas Educacionais (Cempre) Dra. Ruth Cardoso para que meu sucessor iniciasse o período integral.
Com uma equipe dedicada, implantamos o conceito de gestão descentralizada, integrada e participativa. Com autonomia, planejamento criterioso, esforços conjugados e participação popular, os setores da Prefeitura garantiram maior agilidade e eficiência à administração. Para bancar investimentos nas mais diversas áreas, pusemos em prática a política municipal de desenvolvimento e alavancamos a arrecadação municipal. Alguns resultados: 8,2 mil novos empreendimentos com 115 mil empregos diretos e indiretos, Centro de Iniciação Profissional reformulado para atender 18 mil alunos por ano em mais de 60 cursos gratuitos (e não apenas dois como era), Banco do Povo e outras ações.
Muitos não se lembram. Outros nunca souberam dos avanços consolidados em nossas gestões. Há ainda os que, propositalmente, distorcem tudo. Fato é que, sob nossa administração, Mogi das Cruzes despontou entre as 100 cidades mais dinâmicas do Brasil, uma das mais bem administradas do País, uma das mais promissoras para trabalhar e uma das melhores do Estado para morar, segundo estudos de renomados institutos nacionais divulgados na mídia. Por cinco vezes, recebemos do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas do Estado de São Paulo (Sebrae-SP) o título de “Prefeito Empreendedor”. Não por menos, encerramos o segundo mandato, em 2008, com pesquisas apontando 86% de aprovação popular.
Falo do legado deixado para minha Mogi das Cruzes, onde nasci, vivo, criei meus filhos e brinco com meus netos. Falo da população que nos ajudou a reinserir Mogi no mapa nacional do desenvolvimento. Falo de gente simples que me inspirou a produzir melhorias todos os dias no comando da Prefeitura. É por essas pessoas que os sinos dobram. É por elas que recuo na intenção de candidatura.
Quem sabe, minha saída esgote o combustível para a sordidez de uma campanha infrutífera. Quem sabe, sem a minha presença na disputa, os concorrentes se dediquem à imprescindível plataforma eleitoral de apresentar propostas positivas para elevar a qualidade de vida na Cidade. Quem sabe, seja, enfim, uma disputa entre quem tem o melhor plano para manter Mogi na rota do desenvolvimento, na multiplicação de avanços em todas as áreas e, principalmente, para responder aos anseios da população mogiana.
Como político, estou entristecido. Como ser humano, estou resignado. Como cristão, estou agradecido porque acredito que Deus atendeu minhas preces, iluminando minha decisão. Como cidadão, estou otimista de que faço o melhor para Mogi das Cruzes. Não é o fim. Longe de mim a aposentadoria. É apenas um intervalo, um suspiro, para seguir em frente. É da minha natureza vislumbrar dias melhores. É da minha alma, almejar novos desafios. Muito obrigado!