Ricardo Patah, presidente da UGT e coordenador do PSD Movimentos
O filósofo grego Aristóteles dizia que o homem sem virtude é o pior e o mais feroz dos animais. Ele se referia a virtudes cívicas: capacidade de discernir entre o certo e o errado, habilidade de deliberar com imparcialidade sobre a justiça, participar da vida pública e zelar pelas leis que preservam a harmonia social e o bem comum.
O filósofo poderia ter formulado sua teoria por aqui, observando a nossa realidade atual. Como na época de Aristóteles (384 a.C.-322 a.C.), essas virtudes não são praticadas, embora estejam todas na Constituição de 1988, com outra redação. Ou seja, muitos de nossos erros políticos (e outros) são antigos.
Chegou a hora de mudar. Com a volta de Lula à política (independentemente de ele ser presidente ou não), temos a grande chance de eleger um novo Congresso Nacional para mudar o Brasil e o nosso povo ser valorizado, não só na hora votar, mas durante toda a atividade parlamentar.
Hoje, temos o Congresso mais conservador dos últimos 40 anos. Foi renovado em 52% na Câmara e em 85% no Senado. Mesmo com perfil mais diverso – há mais negros, mulheres e congressistas conectados às redes sociais –, ainda existe um descompasso entre os eleitos e a população brasileira: dos 513 deputados federais, há 436 homens e 77 mulheres. É bom que se diga que as mulheres são 51,5% da população.
Quantos trabalhadores temos na Câmara? 108 são empresários, 78 advogados, 34 médicos, 29 professores e 26 funcionários públicos. Trabalhador lá do pé da fábrica e da loja, por exemplo, nenhum. Os CNPJs são a maioria. CPFs, poucos.
Registre-se que nosso Congresso é o 2º mais caro do mundo, apenas atrás dos Estados Unidos, conforme estudo da União Interparlamentar, que avalia o Legislativo de diferentes países. Os nossos 513 deputados e 81 senadores custam R$ 10,8 bilhões por ano.
O Congresso está imobilizado. Três frentes legislativas – bancadas do boi, da Bíblia e da bala– se mobilizam com grande prestígio junto ao governo Bolsonaro. Votam como ele quer ou pede. Deputados e senadores não conseguem participar na condução da política econômica, na defesa dos direitos humanos e na defesa dos trabalhadores públicos e privados e programas sociais. Quem manda lá dentro é o Centrão. Esse nome vem de 1988. Foi usado para designar parlamentares que formavam a maioria e não eram ideológicos.
O Centrão passou a ter destaque, como o conhecemos hoje, em 2014, sob o comando de Eduardo Cunha (envolvido na Lava Jato). Reúne de 170 a 220 deputados de diferentes partidos e apita no dia a dia da política no Brasil como nenhum grupo. Bolsonaro se elegeu criticando esses políticos, afirmando que eles faziam parte da “velha política”, defendiam o “fisiologismo”.
Dois anos depois de ter assumido, sem partido e ameaçado de impeachment, Bolsonaro aderiu ao Centrão. Distribuiu cargos e verbas, e colocou Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG) como presidentes da Câmara e do Senado, respectivamente, gastando muito dinheiro público (nosso): R$ 511 bilhões em emendas parlamentares e R$ 3 bilhões em investimentos em infraestrutura para 250 deputados e 35 senadores.
Agora está tudo dominado. Bolsonaro pilota Câmara e Senado. No discurso de posse, Lira dirigiu-se apenas aos parceiros e disse “nós” (seus parceiros), esquecendo a população. O povo não tem acesso e nem seus representantes são ouvidos. Para nada, diga-se.
Com a entrada de Lula na política, o xadrez eleitoral muda. Ele disse que pode organizar uma frente ampla, com todos os partidos e não só de esquerda. Ele não vê problemas em fazer alianças. Disse que conversa com o Centrão também e outras tendências. Diante desse quadro político, a chance de termos uma nova Câmara e um novo Senado é muito boa. E o simples cidadão poderá, enfim, ser representado.
Artigo publicado no site Poder 360 em 12 de abril de 2021