Em editorial, jornal comenta relaxamento da fiscalização e afirma: “é preciso agir com rapidez para que São Paulo não volte a ser uma cidade suja”.

Há sinais preocupantes de que a Lei Cidade Limpa está sob ameaça – seja por afrouxamento na fiscalização de seu cumprimento, seja pela aprovação pela Câmara Municipal, em primeira votação, de projetos que liberam a publicidade em vários casos em que ela está hoje proibida. Uma reação se impõe, porque, ao possibilitar um combate efetivo à poluição da paisagem urbana, que enfeava a cidade, essa lei representou uma importante conquista para São Paulo.

Foi registrada, nesses primeiros meses do governo de Fernando Haddad, uma queda de 90% nas multas aplicadas aos que desrespeitam aquela lei, como mostra reportagem do Estado. De janeiro a agosto deste ano, foram apenas 226 multas, enquanto no mesmo período de 2012 o seu número chegou a 2.265. Segundo a Prefeitura, a fiscalização continua a agir com rigor e a prova disso é que são feitas em média mais de 1,1 mil remoções de anúncios irregulares por dia. De janeiro a julho deste ano, foram recolhidas mais de 230 mil propagandas irregulares.

Esses números só impressionam à primeira vista, porque, quando comparados com os do governo anterior, ficam bem modestos. Apenas em janeiro de 2012 foram removidos 250 mil anúncios irregulares. Isso ocorre, segundo a Prefeitura, por causa de uma mudança na maneira de contabilizar os anúncios retirados, que excluiu os lambe-lambes, um tipo de pôster coladoem espaços públicos. Comoa diferença é muito grande entre os números deste e do ano passado, é preciso quantificar os lambe-lambes para a explicação ser convincente.

Alega também a Prefeitura que a redução do número de multas se deve ao fato de as pessoas estarem respeitando mais a lei. Mais uma vez, a enorme diferença entre os números – de 226 este ano para 2.265 no mesmo período de 2012 – torna muito difícil aceitar a explicação. Não é razoável acreditar que os que até há pouco tempo insistiam em fazer propaganda irregular na cidade se tenham convertido subitamente em respeitadores da lei.

Assinale-se que o prefeito Haddad baixou dois decretos que tornam menos rígida a Lei Cidade Limpa. Um deles, de fevereiro, liberou cartazes em cinemas e teatros e o outro, baixado há menos de três semanas, autorizou ônibus e táxis a veicular, durante 30 dias, uma campanha destinada a incentivar o uso de bicicleta na cidade. Nesse setor, abrir exceção é sempre um risco.

Esses elementos somados indicam que a posição de Haddad com relação à Lei Cidade Limpa, que tanto benefício trouxe para São Paulo, pode não ser tão firme como deveria. Essa incerteza só favorece aqueles que nunca se conformaram com as limitações à publicidade externa que desfigurou a paisagem da cidade, sujando-a – daí o nome, bem apropriado, de Cidade Limpa da lei em questão – com uma profusão de anúncios de todo tipo.

O Estado de S.Paulo – editorial

Se o prefeito não concorda com a lei, ou alguns pontos dela, deve dizer isso claramente. Do contrário, prevalecerá a impressão de que não age com firmeza para fazê-la respeitar simplesmente porque ela é uma iniciativa do ex-prefeito Gilberto Kassab, que a transformou, com razão, num dos pontos altos de seu governo.

A posição não suficientemente clara de Haddad a respeito, assim como a insistência do setor de publicidade externa em obter mudanças na lei, já se fazem sentir na Câmara Municipal. Atualmente, só pontos de ônibus e relógios de rua podem ter anúncios. O restante da publicidade deve obedecer a severas restrições. O diretor executivo do Sindicato das Empresas de Publicidade Exterior do Estado de São Paulo, José Roberto Fogaça, afirma que outros equipamentos públicos – como bancos, gradis, bancas de jornal, orelhões e banheiros, por exemplo – também devem receber publicidade.

Dois projetos aprovados em primeira votação pela Câmara Municipal amenizam as restrições da Cidade Limpa, como o que autoriza anúncios em ônibus e táxis. Ainda há tempo, pois, de evitar o pior. Mas é preciso agir com rapidez para que São Paulo não volte a ser uma cidade suja.