O ex-secretário Alexandre Schneider e o prefeito de Mogi das Cruzes, Marco Bertaiolli, falam de suas experiências na educação pública e apontam caminhos para elevar a qualidade do ensino nas cidades.
O prefeito Marco Bertaiolli

O prefeito Marco Bertaiolli: “Pesquisas indicam que a escola de período integral tem apoio de 98% da população”.

Embora enfrente graves problemas a nível nacional, a educação no Brasil tem casos de sucesso no plano municipal, indicando que a elevação da qualidade do ensino no País depende mais da melhoria dos processos de gestão do que do aumento de recursos investidos. Essa foi uma das conclusões do 6º Encontro Democrático, evento realizado pelo Espaço Democrático (fundação do PSD para estudos e formação política) no dia 15 de junho, que reuniu dois especialistas no tema: o ex-secretário municipal de Educação de São Paulo, Alexandre Schneider, e o prefeito de Mogi das Cruzes (SP), Marco Bertaiolli.

Clique no vídeo abaixo para ver os depoimentos dos participantes do encontro.

A íntegra dos depoimentos será publicada nos próximos dias no site do Espaço Democrático

Assim como Schneider – que durante os seis anos em que esteve à frente da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo, na gestão Gilberto Kassab, adotou diversas medidas inovadoras, com resultados comprovados – Bertaiolli, reeleito prefeito de Mogi em 2014 com 82% de aprovação popular, tem na educação um dos principais focos de sua administração, tendo investido bastante na ampliação da oferta de vagas de período integral.

O ex-secretário Alexandre Schneider disse que o Brasil tem hoje 50 milhões de crianças no ensino básico, sendo que 82% desse total, ou 41 milhões, estão na rede pública municipal ou estadual. Portanto, afirma ele, “se para mudar o Brasil é importante mudar a educação, é fundamental mudar a educação pública, que precisa de investimentos e mudanças de rota”.

Em sua avaliação, a educação nos municípios tem importância central nesse processo, pois são eles que têm a responsabilidade da formação de base. Contou que, embora o ensino público já seja praticamente universal no País, com 98% das crianças de 6 a 14 anos na escola, ainda há desequilíbrios, com problemas na oferta de vagas e na qualidade do ensino.

Desigualdades regionais

Como exemplo, lembrou que ainda é preciso elevar o percentual de crianças matriculadas na educação infantil (81% atualmente, com meta de chegar a 100% em 2016) e no ensino médio (84% hoje). “Mas esse é o dado global, que não mostra os problemas que temos regionalmente, como no caso das regiões Norte e Nordeste, onde o percentual de alunos matriculados no ensino médio é, respectivamente, de 44% e 46%”, explica Schneider, acrescentando que o problema é ainda mais dramático quando se analisa a proficiência.

Ele mostrou que, no quinto ano do ciclo 1, apenas 40% das crianças aprenderam o que se espera que aprendam em português, sendo que em matemática o índice cai para 35%. “E esse é o melhor número que temos, pois no ciclo 2 apenas 23% aprendem o que deveriam em português, sendo em matemática o percentual cai para 11%. Portanto, temos problemas de inclusão, com falta de vagas em algumas regiões, e temos um problema dramático de qualidade”, afirmou.

Em função disso, segundo o ex-secretário, o Brasil não cumpriu as metas que estabeleceu para si mesmo no ensino médio e no fundamental. “Só atingiu os objetivos no ciclo 1, até o quinto ano”, disse.

A persistência da situação atual, em sua avaliação, pode inclusive acarretar problemas legais para as prefeituras, pois elas têm a obrigação de garantir até 2016 que todas as crianças de 4 e 5 anos estejam matriculadas na escola. “Nem todas as cidades, porém, terão condições de cumprir essa exigência. Assim, os prefeitos que assumirem em 2017 terão sérios problemas, podendo inclusive ser processados pelo não cumprimento da obrigação”, alertou.

Schneider: “É fundamental mudar a educação pública, que precisa de investimentos e mudanças de rota”.

Schneider: “É fundamental mudar a educação pública, que precisa de investimentos e mudanças de rota”.

Ensino de qualidade

Mas, além de atender às necessidades de inclusão, criando vagas para crianças e jovens que ainda não estão nas escolas, as prefeituras também têm responsabilidade na questão da qualidade do ensino.

Schneider citou, nesse sentido, a experiência da gestão Kassab na Prefeitura de São Paulo, que enfrentou desafios como acabar com as escolas de lata que herdou da administração anterior, ampliar o período letivo das crianças (que estudavam apenas 4 horas por dia no modelo anterior) e aumentar a oferta de vagas nas creches do município.

No fim do mandato, disse ele, as escolas de lata tinham acabado; apenas 35 unidades, entre quase 1.000, ainda tinham alunos com 4 horas de aula (sendo que as obras de novos prédios já estavam em andamento ou contratadas); e o número de vagas em creches havia atingido um recorde histórico. “Kassab foi o prefeito que mais ampliou as matrículas em creches na história de São Paulo: quando ele assumiu, havia 60 mil crianças matriculadas nas creches; quando deixou a Prefeitura já eram 214 mil, com 10 horas por dia nas creches”, contou.

Com base nessa experiência, ele disse acreditar que os municípios podem contribuir bastante para a elevação da qualidade do ensino, construindo novas unidades escolares para garantir a inclusão de todas as crianças e jovens que precisam de educação, mas também investindo na qualidade. “Uma sugestão é estabelecer convênios com entidades não governamentais, com regras que garantam a tranquilidade dos pais e que as crianças possam se desenvolver com educação e cuidados de qualidade”, disse.

Como sugestões práticas aos prefeitos interessados em melhorar a qualidade da educação oferecida ​em suas cidades, Schneider propõe a adoção de medidas como a organização de um currículo adequado, investimento na formação de professores com base nesse currículo e na prática da sala da aula, avaliação de resultados vinculada ao currículo, com reforço aos alunos que necessitarem, e ainda o desenvolvimento, no contraturno, de atividades educacionais, culturais, recreativas e esportivas relacionadas ao projeto pedagógico da unidade.

Educação integral

​Muitas dessas sugestões já são realidade em Mogi das Cruzes, onde o prefeito Marco Bertaiolli, que está em seu segundo mandato, vem dedicando atenção especial à ampliação da oferta de vagas de período integral na educação infantil. Em sua participação no encontro promovido pelo Espaço Democrático, ele fez um relato da experiência.

Contou que ao assumir a Prefeitura em seu primeiro mandato, em 2009, encontrou uma fila de 2.500 crianças à espera de uma vaga em creche municipal. “Essa era uma das maiores demandas da população e, para atende-la, construímos desde então 58 novas escolas de educação infantil, criando 7.000 vagas, número que, teoricamente, seria suficiente para atender a demanda anterior e também ao crescimento da população. Contudo, temos ainda uma fila de espera de 1.600 crianças aguardando matrícula, pois a qualidade que oferecemos levou a população a acreditar no serviço e aumentou a demanda”, explicou.

Além de construir escolas, Bertaiolli enfrentou também o desafio de colocar todas as unidades em período integral, como havia proposto em sua campanha eleitoral. Nesse caso, além de desenvolver um currículo correto, foi preciso também convencer professores, diretores e todos os profissionais envolvidos na área de educação sobre a importância do ensino em período integral. “Mostramos que era uma iniciativa fundamental para oferecer às crianças condições de serem adultos diferentes do que somos, que era importante para as crianças e também para os pais e principalmente as mães, que podem voltar ao mercado de trabalho ou buscar capacitação”, disse o prefeito de Mogi.

Segundo ele, no início houve alguma resistência, inclusive de crianças que rejeitavam a ideia de passar a maior parte do dia na escola. “Mas as pesquisas agora indicam que a escola de período integral tem apoio de 98% da população e inclusive acabou o absenteísmo; as crianças só faltam na aula quando têm problema de saúde, porque entenderam que na escola encontram, além das aulas, diversas atividades prazerosas”, explica.

Outro cuidado importante adotado em Mogi foi oferecer uma alimentação rica e saudável para os alunos. Bertaiolli contou que são oferecidas a eles cinco refeições diárias, que valorizam os produtos mais cultivados na região, como caqui e cogumelos. “Mogi já foi inclusive premiada como a cidade que oferece a melhor merenda escolar da região Sudeste, mas, para isso, o município está investindo em 2015, por exemplo, R$ 18 milhões”.

Com todo esse investimento, Mogi das Cruzes dobrou o número de alunos matriculados em escolas da rede municipal de ensino, passando de 21 mil em 2009 para 42.500 em 2015, sendo que, desse total, 50% estudam em período integral. Para atender a esse universo, a Prefeitura assumiu também o transporte de 10 mil alunos diariamente, com uma frota de 65 ônibus próprios e 40 contratados, que também são usados para levar estudantes a aulas práticas em diversos pontos da cidade, como parques e outros equipamentos públicos.