Folha de S.Paulo – Editorial
Assim fica fácil. Confrontado com o problema da superlotação nos presídios, que atinge todos os Estados brasileiros, o governo de Geraldo Alckmin (PSDB-SP) recorreu a uma manobra estatística para minimizar seus índices.
O excesso de presos em relação às vagas disponíveis, calculado em 93%, baixou miraculosamente para 70% graças a um expediente adotado em janeiro deste ano.
Locais ocupados temporariamente pelos detentos, como instalações de triagem, celas de segurança para ameaçados e mesmo enfermarias, passaram a ser considerados como vagas regulares.
Com isso, os presídios paulistas “ganharam” 9.497 novos espaços para os encarcerados, ainda que a expansão seja imaginária.
“Mutatis mutandis”, é como se o governo Alckmin festejasse a expansão dos leitos hospitalares a partir do momento em que se consideram as macas encostadas nos corredores ou a fila para o atendimento na sala de espera.
Uma empresa aérea poderia igualmente anunciar o aumento do espaço disponível aos passageiros na classe econômica –em geral medido em poucos centímetros– dividindo entre os usuários a área interna dos banheiros.
Na concorrência política entre os Estados, a artimanha faz com que São Paulo ganhe alguma vantagem com relação ao Rio de Janeiro e Minas Gerais, cujos administradores penitenciários ainda não atinaram para a metodologia.
Sendo ano eleitoral, não é impossível imaginar a publicidade que pode ser feita sobre esses números: “Governo do Estado amplia em 13,5% as vagas nos presídios”.
Imagens ilustrativas talvez não fossem difíceis de obter, já que de fato seis novas prisões foram entregues no ano passado, com espaço para 4.888 presos (no sistema antigo), ou 5.315 (na nova contagem). Bem menos, em todo caso, do que as quase 10 mil vagas criadas pela pura aritmética oficial.
Como se vê, o governo Dilma Rousseff faz escola –metaforicamente, é claro. Nos últimos anos, os especialistas em finanças públicas têm denunciado o recurso de inflar, estatisticamente, os resultados do superavit fiscal.
Causaram celeuma, por outro lado, as inaugurações do programa “Minha Casa Minha Vida”, em que rachaduras na parede surgiam em residências recém-construídas.
No que poderia ser jocosamente chamado “Minha Enfermaria Minha Vaga” do governo paulista, o superavit da ocupação presidiária passa por maquiagem semelhante. Nas planilhas, os presos não ocupam espaço.
Sob a aparência do cálculo preciso, o governo estadual faz um exercício de prestidigitação. Surge uma vaga mágica, mas o espetáculo é dos mais mambembes.
Crédito da foto: Edson Lopes Jr/A2