Em editorial, jornal critica a "prestidigitação aritmética" utilizada pelo Governo Estadual para inflar o número de policiais que prestam serviços nas ruas.

Folha de S. Paulo – Editorial

Se o aumento nos crimes contra o patrimônio guarda relação com a ineficiência policial, como avaliam especialistas em segurança pública, é desanimadora a perspectiva de reduzir essas infrações no Estado de São Paulo.

Observam-se duas curvas opostas, nos últimos dez anos: enquanto crescem os casos de roubo, cai para patamares abaixo da média mundial o efetivo policial paulista, quando se considera o total das polícias Científica, Civil e Militar.

Em 2005, São Paulo tinha 314 policiais para cada 100 mil habitantes. Em 2013, a taxa caiu a 282, inferior à média global de 303 por 100 mil, segundo dados da ONU.

Nesse período, a população de São Paulo passou de 40,3 milhões de pessoas para 43,7 milhões. Em contraste, as polícias encolheram de um total de 123.156 homens, em 2005, para os atuais 120.103.

São números que, se não explicam de todo o aumento de 54% nos roubos, na comparação entre o primeiro bimestre deste ano e os dois primeiros meses de 2005, decerto mantiveram estagnado ou em queda o policiamento ostensivo e a investigação, fundamentais para prevenir esse tipo de ocorrência.

Apesar de uma auspiciosa estabilização dos casos de homicídio, hoje em patamares bem inferiores à média brasileira, a sociedade paulista convive há nove meses com uma expressiva alta no total de roubos. O governo de Geraldo Alckmin (PSDB-SP), porém, recorre à prestidigitação aritmética para inflar o número de policiais que prestam serviços nas ruas.

Com o uso de critérios inéditos no país, o comando da Polícia Militar de São Paulo passou a considerar que todo o seu efetivo administrativo nos batalhões está pronto para o combate direto ao crime.

Dessa maneira, mais de 14 mil homens em atividades-meio e burocráticas – mecânicos, atendentes do serviço telefônico 190, funcionários do departamento de pessoal e até assessores de imprensa – são somados aos 59 mil policiais que de fato atuam no patrulhamento preventivo e ostensivo do Estado, para assim obter o total propalado de 73 mil homens em atuação.

Para o governo, a adoção dessa outra forma de contabilidade criativa se justificaria porque tais servidores podem ser convocados para trabalhar na rua a qualquer momento. Até na corporação a hipótese é considerada remota.

Não há solução fácil para reduzir a criminalidade em São Paulo, é verdade. Hoje, só 2% dos casos de roubos no Estado são esclarecidos, o que seguramente estimula a prática desses crimes. Coibi-los e investigá-los depende de um número adequado de policiais nas ruas – e não só nas planilhas.